sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Não consta que J. Cristo tivesse biblioteca

Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

O mais que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca...

E não é assim?

O poema chama-se "Liberdade" e foi escrito em 1935 pelo senhor Fernando, pessoa de muitos nomes e vasta obra.
Num espaço como este, não me arrependeria de referir aquele seu "Sê todo em cada coisa. Põe quanto és No mínimo que fazes" que não hesitaria em assinar ao lado de Caeiro. Ou daquele Menino Jesus, d'O Guardador de Rebanhos, que me fez gostar ainda mais da minha namorada, que mo deu a ler há uns tempos, bem-haja ela!
Passaram agora 75 anos da edição da sua Mensagem, que a editora Guimarães assinalou com a edição de um facsimile da versão dactilografada que serviu de base à 1ª edição, da extinta casa editora Parceria A. M. Pereira.
O livrinho, na edição de 1934, vi-o eu à venda, numa livraria alfarrabista do Largo do Carmo, em Lisboa, já lá vão muitos anos, por 450 contos, na moeda de então (uns bons 2.300 euros de agora).
Por que preço andará agora essa primeira edição, não sei. Se a virem em bom estado, a bom preço, comprem, pois é um valor seguro. Se não for pelo conteúdo (há apreciadores e não apreciadores, tão respeitáveis uns como os outros), seja para vender mais tarde – valorizada.
Entretanto, fico-me com O Banqueiro Anarquista, a fazer boca para se falar aqui, um dia destes, da "febre de criar bibliotecas" no tempo exacto em que o senhor Fernando andou a escrever aquelas coisas.

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