sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Está lá tudo, numa biblioteca

Uma biblioteca é um livro aberto – diz tudo sobre o seu possuidor: bibliófilo ou bibliómano, as preferências do dito, a sua relação com os livros, como evoluiu o seu gosto ou mesmo o seu poder de compra.

Cada biblioteca é uma entidade específica, única. Têm em comum os livros e o gosto de alguém que resolveu coleccioná-los; mas quão diferente a biblioteca pessoal de Calouste Gulbenkian da de Alfredo Canana ou a de Ezequiel Ferreira; mais próxima das bibliotecas de Salema Garção ou a do comandante Ernesto Vilhena, todavia tão diferente.

Rui Santos Gomes não era um eminente vulto académico, nem um empresário. Nem tinha dinheiro que se visse. Mas gostava de livros e dedicou-se, toda a vida, a fazer uma biblioteca, a sua. Viu muitos livros, comprou bom e mau, vendeu muito do bom em alturas de maior aperto de finanças. Comprou por cá, especialmente em Lisboa; emigrado, continuou a comprar, encomendando directamente a livreiros-antiquários, em especial a João Rodrigues Pires, d’O Mundo do Livro, e outros que tal. Muitos dos seus livros, andou com eles às costas de Portugal para o Canadá e de lá para cá, no regresso de um período de anos de emigração.

Já velho, preocupou-se com o destino futuro da sua biblioteca – queria-lhe como a um filho ou filha, que não tivera. Passou por umas tantas bibliotecas públicas, à procura de uma a que pudesse fazer uma doação, na condição de tratarem bem os livros e de não os dispersarem. Nenhuma lhe mereceu confiança. Acabou por os deixar, na sua morte, a um amigo recente, a quem pediu que lhe tomasse conta dos seus livros, que eram como filhos.

Mantém-se íntegra a biblioteca de R.S.Gomes. Teve melhor sorte que as do Engenheiro Salema Garção (que há 60 anos recebeu uns quantos livros roubados da Biblioteca Nacional de Lisboa, vendida em leilão em 2004) ou a do Comandante Vilhena, vendida em leilão nos anos de 1990. Uma nota sobre as razões dos herdeiros de alguns grandes bibliófilos, que decidem vender "a tralha" deixada pelos "velhos": “A Infanta Capelista”, de Camilo Castelo Branco, um livrinho que fez parte da Biblioteca Vilhena (um dos 3 ou 4 únicos exemplares que existem da 1ª edição, que foi retirada do mercado logo que foi publicada, a pedido do rei D. Pedro V) foi vendido, num leilão em Fevereiro de 2009, por 6.500 euros.

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