domingo, 14 de junho de 2009

O ingrato T. Sousa (a fazer boca para a sopa de alho)

O meu amigo T. Sousa foi o ladrão de livros mais ingrato que me foi dado conhecer. Sem saber, benza-o Deus, que já vi coisas piores.

Nas três montras enormes da livraria, um único título – “Uma coisa em forma de assim”. Parecia que tinham lá posto a tiragem inteira. Sem exagero, estavam ali mais de 100 exemplares, numa monotonia enjoativa de branco e azul, em três filas sobrepostas, a toda a largura das vitrinas. Sem dúvida, chamativas. Do lado de fora, contemplando a obra, o senhor autor, que se dizia ser, também, o proprietário da livraria (eu conhecia-o de vista, mas o T. Sousa, não).

Quando saíamos dessa tal livraria, é que deparámos com aquela obra-prima de vitrinismo. Ao pôr o pé na rua, o T. Sousa não se conteve: “Uma coisa em forma de assim? Quem é que vai lembrar de uma m. assim?!” E ria, com gosto, o meu amigo, ao modo dos ignorantes convencidos. E acrescentou, quando passávamos pelo O’Neil, alto e bom som, como antes, na linguagem crua que usam certos beirões: “Uma coisa em forma de assim. Ainda gostava de encontrar o filho da p. que escreveu isto”.

Insultado praticamente na cara, pelo energúmeno, o autor (que aguentou, firme) não deixaria de remoer intimamente umas sábias frases que escrevera, a propósito, no tal livrinho: “certa idiotia é susceptível de conferir ao idiota seu proprietário (ou seu prisioneiro) uma espécie de segurança em si própria que o levará, em determinados momentos, julgo eu, a uma beatitude muito próxima do que se pode chamar estado de felicidade”. Estavam quites, portanto, Sousa e O'Neil.

Desconhecendo o ajuste de contas, admirei por instantes a contenção de que o autor-proprietário fora capaz. Quando, já bem afastados, consegui identificar ao meu amigo quem era quem no episódio de minutos antes, a risota chalaceira ainda redobrou. Ele ria, ria, ria.

Quando se conseguiu conter, para minha surpresa, de dentro do blusão impermeável que trazia vestido, foram saindo, um a seguir ao outro, os livros (por junto, uns 5 ou 6) que, com o maior dos à-vontades, o idiota ingrato roubara na livraria do senhor da "coisa".

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SOPA DE ALHO

Ingredientes

1 cabeça de alhos (50 g.)

50 g. de margarina

1 litro de água

2 gemas de ovos

4 fatias finas de pão

sal q.b.

Separe e descasque os dentes de alho. Coza-os na água, em panela normal ou de pressão. Entretanto, frite as fatias de pão, numa frigideira, em metade da margarina, e coloque-as no fundo de uma terrina. Passe a sopa. Fora do lume, junte à sopa as gemas de ovos e o resto da margarina, mexendo bem. Deite na terrina e sirva.